Lino Batista
Em busca de sabedoria em tempos de relativismo professo. Talvez um pouco de classicismo seja necessário, um retorno aos paradigmas perdidos... Procuro dessa forma momentos de lucidez para além de razões e desrazões extremadas. Neste blog coloco à vossa disposição textos de minha autoria nos quais como católico apostólico romano busco alcançar sabedoria verdadeira. Com a graça de Deus poderei combater o bom combate contra a mentira que reina quase absoluta hodiernamente. ¡VIVA CRISTO REY!
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quinta-feira, 25 de abril de 2024
Pensamento avulso XCVII
sábado, 6 de abril de 2024
Política: do bem comum ao jogo de poder
O conceito de política é um conceito que, tomando de
empréstimo a lógica aristotélica, chamaríamos de equívoco em nosso contexto, ou
seja, um conceito em que para um único nome ou termo há diferentes conceitos mentais
associados. Isso significa que apesar do nome “política” ser único, há
diversidade de significados que variam ao longo da história.
A fins didáticos iremos distinguir neste texto duas grandes
matrizes de definição do que é política, buscando transformar esse conceito num
conceito análogo, onde tomando de empréstimo os dizeres do filósofo brasileiro
Mário Ferreira dos Santos, obtenhamos uma “síntese da semelhança e da diferença”
entre as duas visões de política.
Podemos dizer, em linhas gerais, que em qualquer cenário a
política diz respeito à sociabilidade humana e às relações de poder. No
entanto, o entendimento acerca desses fundamentos da política não implica numa
mesma definição desta. Como já dissemos, há duas linhas que iremos investigar.
A primeira advém da compreensão clássica que permeou a
filosofia política desde a Antiguidade ao Medievo. Essa compreensão é definida
por alguns estudiosos das ciências sociais, como idealismo político.
Certamente esse é um termo controverso, mas que resumidamente indica que a
visão clássica colocaria a teoria sobre o que deveria ser a política à frente
da política concreta, como se o que deve
ser estivesse acima daquilo que é.
Se observarmos mais atentamente as obras de política de um Aristóteles ou de um
Raimundo Lúlio, por exemplo, vemos que não há uma sobreposição da teoria sobre
a prática, do vir a ser sobre o que é, mas a busca pela
universalidade própria da Filosofia ou do entendimento da realidade concreta
por meio de valores e princípio universalizáveis.
Em meio à essa definição clássica podemos considerar que a
política deve ser vista como a busca pelo bem comum. Política e ética, nesse
contexto, são complementares, devendo a política refletir o bem próprio do
horizonte moral:
O governo que serve ao interesse dos governantes é tirânico. Só o
governo que promove a vida boa dos governados é bom.
[...] Para ser bom, o governo tem de ter uma autoridade
reconhecida e aceita pelos governados, não o mero poder ou força ao qual eles
se submetem por medo. (ADLER, 2010, p. 127)
Apesar das divergências acerca da política ao longo dos
séculos, o núcleo conceitual comum permaneceu inalterado, entretanto as
circunstâncias históricas, bem como sua análise conceitual, alterou-se e na
virada que erigiu a Modernidade uma nova forma de enxergar a política surgiu. Para
contextualizar e nos situarmos historicamente cabe mencionar alguns eventos do
período como a queda do império romano no Oriente em Constantinopla (1453), as
Grandes navegações (séc. XIV-XV) e as Guerras Italianas entre 1494 e 1559.
É nesse contexto que Nicolau Maquiavel (1469-1527) tem uma
percepção sobre a política que promove uma reviravolta na história das ideias,
inaugurando o que muitos teóricos convencionaram chamar de realismo político,
bem como a ciência política. Em oposição aos “idealistas políticos”, a proposta
era partir da realidade “nua e crua” daquilo que passou a ser o núcleo da noção
de política, a saber, o conceito de poder.
Em sua obra prima, “O Príncipe”, Maquiavel lança mão de seus
principais conceitos que exploraremos a seguir. Essa obra que a princípio
serviria de manual ao príncipe, no caso Lourenço de Médici (1492-1519) a quem
dedicou o livro, tornou-se base de entendimento para a nova visão de política
que até hoje é fundamental para compreendermos a política não apenas na
dimensão da ciência política, mas principalmente na prática da política.
Para delimitarmos nossa exposição focaremos em dois pontos principais:
a separação entre ética e política e a virtù
(virtude) necessária ao exercício do poder pelo príncipe. Se o horizonte da
política na Antiguidade era o bem comum, na Modernidade o núcleo da política
torna-se a conquista e manutenção do poder. Nesse conceito se destaca a
separação entre ética e política, afinal nesse processo de manutenção do poder,
o príncipe estaria justificado a agir em desconformidade com os valores e
princípios morais socialmente aceitos, como podemos observar no trecho abaixo:
Donde é necessário, a um príncipe que queira se manter, aprender a
não ser bom e usar ou não da bondade, segundo a necessidade. (MAQUIAVEL, 1986,
p. 90)
Podemos perceber com isso, que de um lado, a ética
(moralidade) está inserida na esfera privada, enquanto a política está inserida
na esfera pública. Fica a questão prática: como o príncipe deve agir politicamente?
Frente ao cenário da distinção citada, primeiramente o político deve ser capaz
de captar o amor e o temor dos seus súditos, mas na incapacidade de alcançar
ambos, seria preferível alcançar o temor. Para gerir o horizonte do poder, o
príncipe deveria ter em mente dois conceitos: o de virtù e fortuna. Este
teria a ver com as situações que escapam do controle do governante, enquanto
aquele teria a ver com a capacidade do príncipe em lidar com tais situações.
Poderíamos exemplificar essa relação com uma situação
prática em que haja uma situação de seca em que os grãos estão sendo produzidos
em baixa quantidade. O príncipe não teria responsabilidade com a seca
diretamente, mas deve ser capaz tanto de se precaver quanto de agir de tal modo
que os grãos produzidos, ainda que em menor quantidade possam atender os
súditos.
Referência bibliográfica:
ADLER, Mortimer J. Aristóteles para Todos. tradução. Pedro Sette-Câmara. São Paulo: É
Realizações, 2010.
MAQUIAVEL,
Nicolau. O Príncipe.11 ed. tradução. Roberto
Grassi. São Paulo: Bertrand Brasil, 1986.
quarta-feira, 3 de abril de 2024
Espírito acusatório
Todo ano na quaresma escuto algumas falas que acredito também sejam ouvidas pelo meu leitor que busca viver esse tempo em conformidade com o que manda a Santa Igreja. Trata-se de expressões como: “Do que adianta não comer carne e ficar fazendo coisa errada” ou “a pessoa bebe o ano todo, mas acha que parar na quaresma vai adiantar alguma coisa”. Certamente há nelas um fundo de verdade, mas o que elas expressam é antes um espírito acusatório do que um espírito admoestativo, uma censura ao bom comportamento com a aparência de uma crítica a uma suposta hipocrisia. O propósito deste texto é justamente mostrar a malícia que há nesse modo de proceder que não deve amedrontar ou desanimar a quem que, com o coração sinceramente contrito, queira viver uma santa e piedosa quaresma.
Lembro-me que certa vez em que eu, recém saído da adolescência, fiz a abstinência de carne na Quinta-feira Santa. Pois bem, nesse dia como em muitos outros, saí para almoçar com alguns colegas da empresa em que eu estagiava para comer num restaurante especializado em carnes. Qual não foi a surpresa deles quando pedi um omelete. Alguns manifestando uma surpresa autêntica, alguns dando de ombros e outros ainda ironizando e dizendo que Deus não havia pedido esse tipo de atitude. Fiquei firme em minha resolução e comi um ovo frito, pois não estavam servindo omelete.
Não conto essa história para me gabar, afinal o fazia mais por tradição e resolução fraca do que pela compreensão de partilha com o Sagrado Sacrifício de Nosso Senhor, mas ainda assim lucrava os benefícios espirituais da prática. O que quero na verdade é mostrar uma prática comum que as falas reproduzidas no início do texto representam e que chamo de “espírito acusatório”. Esse “espírito” é que motivava o alerta de Nosso Senhor no evangelho de S. Mateus capítulo 23, versículo 13, em que Ele repreendia os fariseus que não entravam e não deixavam os outros entrarem. Observe o meu leitor que geralmente quem faz essas críticas aos católicos não fazem eles mesmos nenhum tipo de sacrifício ou vivem a religião. Repetem as atitudes dos fariseus quando acusam os outros de farisaísmo.
Mas isso não é uma atitude isolada ou fortuita, afinal vivemos num mundo e numa era hostil,onde as práticas cristãs são apontadas como sinais de hipocrisia. Por vezes a hostilidade é clara e virulenta, mas muitas vezes ela aparece sutilmente. Neste caso, o acusador tece elogios aos valores que se julgam cristãos, mas têm ojeriza à sua prática real, talvez porque tais práticas exponham sua tibieza. Entretanto, fato é que pesa, aos olhos do mundo, ao católico convicto a fama de falso moralista quando tal definição caberia melhor aos acusadores que imitam o primeiro acusador.
Quaresma de 2024
Pensamento avulso XCVI
terça-feira, 26 de março de 2024
O escritor é maior que o agitador
Confesso que não sei o que se produz na academia acerca da Literatura, se bem que vez ou outra deparo-me em meu trabalho como professor com referências a essas produções. Portanto, o que direi aqui me chega majoritariamente à boca miúda ou de manifestações espaçadas de descontentes com o "sistema", seja lá o que isso for.
Trata-se de acusações ao escritor maior da literatura brasileira: Machado de Assis. Tais acusações mencionam sua suposta indiferença política, quando na verdade o que tais acusadores esperavam dele era o perfil de um agitador de DCE, o que graças a Deus não seria possível, afinal Machado não pisou nos corredores da universidade, mesmo quando essa era mais respeitável.
O problema desses acusadores é de não compreenderem um verdadeiro artista, pois consideram a arte como uma ferramenta estritamente política, na pior acepção do termo. O ativista de plantão não consegue compreender uma mente complexa, e sejamos sinceros, nem uma mente simples, mas tão e somente conseguem compreender minimamente mentes simplórias como as dele, onde um abismo de ignorância, engole outro num círculo vicioso de simplismos. Certamente há escritores em que se evidencia uma contundência crítica maior no que tange à realidade social e política, como no caso de Lima Barreto e Graciliano Ramos, no entanto, ainda nesses casos a literatura que produzem não se resume a panfletagem ideológica, mas se constituem em obras de verdadeiro valor artístico.
Dirijo-me aos parvos críticos de Machado, que num anacronismo sem par buscam nele um militante identitário: Machado de Assis fez mais contra o racismo do que mil militantes de DCE, demonstrando que a inteligência, o refino de raciocínio e o esforço pessoal superam o arrivismo. Qualquer negro ou pardo se beneficia muito mais da leitura de suas obras do que na leitura de cartilhas que desconsideram que as tragédias humanas são ainda maiores que o racismo, sendo esta uma tragédia entre outras.
E para que não me venham importunar como se eu estivesse a defender toda a situação deplorável que a sociedade brasileira vivenciava à época, lanço mão de uma estrofe de “O Navio Negreiro”, do poeta Castro Alves:
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!
Segunda-feira Santa 25 de março de 2024
Festa da Anunciação transferida
segunda-feira, 25 de março de 2024
O que é Filosofia?
A pergunta que intitula nosso texto é das mais comuns quando
alguém, principalmente estudante, depara-se pela primeira vez com a matéria.
Diferentemente das demais disciplinas escolares em que o objeto de estudo é bem
determinado e específico, a Filosofia tem uma amplitude investigativa mais
extensa. Isso significa que a Filosofia é uma disciplina que tem aspiração à
universalidade, enquanto as outras disciplinas são particulares, ou seja, a
Filosofia tenta enxergar o todo dando-lhe uma unidade cognoscível[1], enquanto as ciências buscam analisar ou compreender objetos
específicos.
Para compreender essa relação podemos fazer uma analogia com
o jogo de xadrez. Enquanto as ciências como a Física e a História, por exemplo, focariam em peças específicas como um peão ou uma torre, a Filosofia veria o
tabuleiro como um todo relacionando as peças entre si.
Com as considerações acima temos um esboço da resposta ao
que é Filosofia, a saber, um conhecimento sobre a totalidade ou conjunto dos
próprios conhecimentos adquiridos. Ao longo de sua história, a Filosofia teve
alterações em sua abordagem, mas essa busca parece ser sua sina. Além dessa
busca a definição clássica, ou seja, desenvolvida entre os filósofos gregos
Antigos como Platão e Aristóteles, passando pelos pré-socráticos e helenistas,
tinha por base o uso da razão natural
como instrumento de entendimento da realidade em sua totalidade. Eis então o
substrato ou essência da filosofia clássica que se manteve durante séculos como
paradigma da filosofia como podemos observar no trecho abaixo:
“A filosofia é um conjunto de conhecimentos naturais metodicamente
adquiridos e ordenados, que tende a fornecer a explicação fundamental de todas
as coisas.” (RAEYMAEKER, 1969, p.
36)
Podemos verifica que Raeymaeker destaca, como dissemos acima, os termos “conhecimentos” e “todas as coisas” que representam a racionalidade e
universalidade próprias do saber filosófico. Entretanto, podemos perceber
outras duas dimensões fundamentais da filosofia clássica que ainda hoje serve
de bússola aos filósofos contemporâneos, a saber, a ordem e o caráter natural do empreendimento filosófico. O primeiro
indica que há uma organização e métodos no “trabalho” do filósofo que procede
ordenadamente, supondo também uma ordem na realidade. Já o segundo ponto indica
que a filosofia se limita ao conhecimento natural não recorrendo a elementos
sobrenaturais em suas investigações, ainda que muitos filósofos reconheçam e
pressupunham uma realidade sobrenatural.
Referência bibliográfica:
RAEYMAEKER, Luís de. Introdução à Filosofia. 2. ed. tradução. Alexandre Correia. São
Paulo: Herder, 1969.
[1] Que
pode ser conhecida.